expresso.ptHenrique Raposo - 18 abr. 18:42

As elites de esquerda sabem quanto custa meia dúzia de ovos?

As elites de esquerda sabem quanto custa meia dúzia de ovos?

Em Abril de 2020, um “gallon” de gasolina custava 1.9 dólares, subiu para 4.2 em Abril de 2022 e agora está nos 3.7. Para o urbanita woke privilegiado que vive no centro da cidade e que não precisa de carro (até terá um desprezo verde e ideológico pelo automóvel), esta oscilação é insignificante. Mas, para os americanos médios de todas as raças e cores, este e outros preços são decisivos

A resposta - a julgar por aquilo que se passa nos EUA e em tantos outros países em que a esquerda passou a ser o lado snobe da sociedade - é simples: não, não sabem, porque a esquerda deixou de pensar em termos de classe social e opressão económica e passou a pensar apenas em tribos identitárias e sexuais; não sabem, porque a esquerda passou a ser o clube dos privilegiados com acesso a curso superior. É triste ver aquilo que se está a passar, na verdade: a esquerda está a fazer com o “credencialismo” académico aquilo que a velha direita fazia com o sangue eo apelido das boas famílias: é um fator de snobeira contra os mais pobres, que, como seria de esperar, não têm essas credenciais académicas. A meritocracia, que começou à direita, passou a ser o sangue azul desta nova esquerda afastada intelectual e socialmente o cheiro a pobre e do bar do sindicato ou do cooperativa.

A situação é esta: quando cruzamos o mapa eleitoral com o mapa dos rendimentos, fica claro que os condados mais ricos votam no Partido Democrata enquanto que os condados mais pobres votam no Partido Republicano, que roubou à esquerda a ideia de classe social e, não por acaso, os pobres das minorias (hispânicos, asiáticos e até negros) estão a votar cada vez mais no trumpismo. Antes de ser negro, castanho, branco, gay, hétero, homem ou mulher, um pobre é pobre e está preocupado com o preço dos ovos com os quais pode fazer a omeleta que salva o dia à mesa.

Como não consegue sentir estas dores dos mais pobres, a esquerda americana não percebe porque é que os mais pobres das outras comunidades (hispânicas, negras, asiáticas) estão a desviar o voto para Trump e também não percebe como é que o povo não está contente com os resultados económicos de Biden (desemprego baixo; rendimentos altos). Em primeiro lugar, não percebe que o aumento geral dos salários pode significar apenas que os salários mais altos subiram; não quer dizer que os salários mais baixos subiram em igual medida. Em segundo lugar, não percebe o impacto que a inflação teve e ainda tem nos mais pobres. Para quem tem dinheiro, o preço dos ovos é irrelevante, meia dúzia pode custar 1.50 ou 2.50, que no final não se dá por isso. Mas, para quem tem pouco dinheiro, essa diferença pesa e, mais importante, estas pessoas mais pobres lembram-se de que há três anos os ovos custavam muito menos. De igual forma, também se lembram que a gasolina também estava mais barata. Em Abril de 2020, um “gallon” de gasolina custava 1.9dólares, subiu para 4.2 em Abril de 2022 e agora está nos 3.7. Para o urbanita woke privilegiado que vive no centro da cidade e que não precisa de carro (até terá um desprezo verde e ideológico pelo automóvel), esta oscilação é insignificante. Mas, para os americanos médios de todas as raças e cores, este e outros preços são decisivos, e há uma grande diferença entre 1.9 e 3.7, até porque passaram mais de um ano com o “gallon” nos 4 ou mesmo 5.

A forma como se calcula a inflação é em si mesmo snobe e parcial. Como diz Michael Powell, o cálculo core da inflação não conta com os preços da comida eda gasolina. Como assim? Isto só estimula ainda mais o choque de classes. O preço da comida – que está fora do cálculo – esmaga os 20% mais pobres que gastam um terço do seu rendimento em comida, enquanto que os 20% mais ricos só gastam 8%. E já vimos o que se passou com o preço da gasolina. Se acrescentarmos o aumento dos juros para quem tem casa e o preço das casas para quem não consegue comprar ou alugar, não fica difícil compreender o estado de alma dos mais pobres, muito críticos em relação aos Biden.

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