expresso.ptDiogo Martins e João Moreira da Silva - 1 mai. 07:54

O 25 de Abril e a circulação de ideias: o contributo da PARSUK

O 25 de Abril e a circulação de ideias: o contributo da PARSUK

Tal como os estudantes portugueses dos anos 60, nunca mais queremos estar orgulhosamente sós

Os ventos de mudança já se sentiam nos anos 60: ideias de liberdade chegavam de todas as partes do mundo. Os membros da Casa dos Estudantes do Império, em Lisboa, reuniam-se discretamente para discutir textos anticoloniais vindos de África e da Europa. Os estudantes de Lisboa protagonizavam a crise académica de 1962: ocupavam a cantina da Universidade e anunciavam o luto académico em protesto contra a repressão do Estado Novo. A liberdade era proclamada cada vez mais alto. Em 1969, dava-se uma nova crise académica, desta vez em Coimbra, onde circulavam panfletos do Maio de 68, em França. Vários estudantes foram detidos pela PIDE e forçados a ir combater para a guerra colonial. Alguns deles iam encontrar, em terras africanas, os oficiais portugueses que se viraram contra o regime salazarista para formar o Movimento das Forças Armadas. Não é por acaso que se diz que a revolução nasceu em África.

A história do 25 de Abril é a história da circulação de pessoas e de ideias – e estas são apenas algumas destas histórias. Os ideais da revolução, que viria a encerrar o capítulo do fascismo português, não foram inventados apenas em Portugal – muito pelo contrário. Debates sobre ditaduras, democracias, o papel do estado, a participação do povo ou a libertação das colónias chegavam a toda a velocidade de vários pontos do mundo: África, Ásia, América e Europa. As ideias eram contraditórias e levavam a aguerridos debates entre sociais-democratas, socialistas, comunistas, democratas-cristãos e tantos outros. Em conjunto, estas ideais culminaram no evento que nos permite, hoje, escrever todas as palavras e não apenas algumas. Numa época em que muitos querem estar orgulhosamente sós, lutar pela circulação de ideias e de pessoas significa defender a nossa democracia.

Fundada em 2008, a Portuguese Association of Researchers and Students in the United Kingdm (PARSUK) tem-se posicionado como uma promotora do mesmo princípio que marcou a revolução de 1974. Contrariamente aos anos 60, quando as ideias que desafiavam o regime eram silenciadas e a sua circulação tinha de ser feita de forma discreta, defendemos a liberdade total e, com ela, a livre circulação de pessoas e ideias portuguesas pelo mundo. Nos últimos quinze anos, temos procurado identificar os Portugueses que se formaram no Reino Unido, compreender as suas preocupações e motivações e oferecer apoio nas suas trajetórias profissionais, visando também o seu potencial impacto positivo para Portugal e para o mundo.

Na sua curta história, a PARSUK, com o apoio de parceiros, tem oferecido oportunidades de intercâmbio e partilha de conhecimento entre países, resultando em mais de 1000 candidaturas e 50 bolsas atribuídas nos seus diferentes programas. Para muitos destes jovens portugueses esta foi a porta de entrada para uma carreira académica e científica internacional. Hoje, Num contexto nacional e internacional em grande mudança – marcado, em particular, por um aumento acentuado na emigração dos jovens portugueses – a PARSUK tem consolidado a sua identidade. Acreditamos que a criação de uma comunidade dinâmica, diversa e inclusiva tem um papel crucial não só na ciência e no ensino superior, mas também no combate às ideias autoritárias que colocam barreiras à troca de ideias entre países.

Conscientes de que muito ainda está por fazer, procuramos continuar a crescer para garantir a promoção dos valores democráticos conquistados durante o 25 de Abril – que nunca devem ser dados como garantidos. No futuro, continuaremos a proporcionar plataformas de diálogo aberto, fundamentado, consequente, num ambiente seguro, marcado pelo respeito pela diferença. É no encontro e na troca ideias, por vezes divergentes, que grandes revoluções humanas têm lugar – e acreditamos ter um papel fundamental em facilitar esse caminho. Por isso, no contexto da celebração dos 50 anos de democracia em Portugal, a PARSUK oferece três recomendações especificamente dirigidas às instituições educativas, entidades governamentais, e à sociedade civil.

Em primeiro lugar, defendemos o fomento da educação cívica: investir em programas educacionais que promovam o entendimento dos valores democráticos e da importância da participação cívica desde a infância, preparando assim as gerações futuras para defender e fortalecer a democracia. Estes programas devem incluir uma perspetiva global, permitindo que as novas gerações aprendam com a nossa história e contribuam para um futuro mais inclusivo. Em segundo lugar, a PARSUK defende o incentivo ao debate político construtivo. A prática de debates e discussões saudáveis e informadas sobre questões políticas e sociais deve ser integrada nos currículos, ao longo do percurso educativo dos jovens portugueses, promovendo a diversidade de opiniões e o respeito mútuo – elementos essenciais para a consolidação da democracia. O objetivo destes debates será estimular o pensamento crítico e a capacidade de argumentação dos jovens. Neste sentido, é fundamental destacar a importância da tolerância e do respeito pelas opiniões divergentes para fortalecer os princípios democráticos entre a próxima geração de cidadãos portugueses.

Por fim, a PARSUK recomenda o combater à desinformação através da promoção da literacia digital – nomeadamente, o desenvolvimento de iniciativas abrangentes para capacitar as pessoas a identificar e enfrentar a desinformação. A promoção da literacia digital é fundamental para ensinar os cidadãos a navegarem de forma crítica e responsável no mundo digital. Estas iniciativas devem ser integradas nos sistemas educativos e na sociedade em geral, garantido que todas as pessoas têm a capacidade para discernir informações precisas e tomar decisões informadas em ambientes digitais cada vez mais complexos.

2024 é um ano decisivo para o futuro de Portugal e do mundo: cerca de 50% da população mundial vai poder votar em eleições, desde os EUA à Índia. Prevêem-se várias reorganizações políticas – e algumas delas podem causar obstáculos à circulação de pessoas e ideias entre países. Organizações como a PARSUK desempenham um papel fundamental na promoção do envolvimento cívico, do pensamento crítico, do debate construtivo, e no combate à desinformação. Estamos comprometidos em continuar a desempenhar este papel essencial na defesa intransigente da circulação de pessoas e ideias, que tão importante foi para a revolução e democracia que nos permite escrever estas palavras. .

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