[email protected] - 13 set. 08:18
E também sou gay: sou humano
E também sou gay: sou humano
1. O discurso jurídico desportivo tem a tendência para se focar, em demasia, nas questões que implicam a análise da legislação desportiva estatal – no caso de Portugal – ou nas que convocam a norm
ação das federações desportivas, nacionais e internacionais. Por aí não vem mal ao mundo, desde que se tenha consciência que há “outro Direito” para além desse. Com efeito, antes do agente desportivo, enquadrado por essa normatividade especial, existe sempre, sem possibilidade de ser apagado, todo um conjunto de direitos que olham o agente desportivo, particularmente o praticante, como titular de direitos humanos (ou fundamentais).
Antes de ser um “sujeito do Direito do Desporto”, o praticante é um sujeito do Direito aplicado ao desporto, algo que é muito mais abrangente.
2. Exemplo do que afirmamos recolhemos em sede de princípios fundamentais da Constituição da República Portuguesa, que no seu artigo 1.º estabelece que Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Aí está, bem expresso, um dos pilares do nosso Estado, sociedade e Direito, a dignidade da pessoa humana, não sendo de mais lembrar em ambiente desportivo.
3. Por outro lado, neste e em outros espaços, temos vindo a sublinhar que o desporto de hoje não é um desporto de homens brancos e heterossexuais. Não é assim e – nunca mais será assim -, e as organizações desportivas têm de oferecer respostas a este "novo" desporto, não podendo fechar os olhos à multiplicidade destas facetas que existem na prática desportiva, como sinónimo de liberdade.
4. Dimitri Pavadé, atleta francês, ficou em quarto lugar na prova de salto em comprimento T64 dos Jogos Paralímpicos de Paris. Numa rede social procedeu a uma publicação onde afirma, ao assumir a sua homossexualidade, quase de forma conclusiva: "Sim, sou pequeno, mestiço, perneta e gay".
Pela sua relevância – em vida “vivida” - transcreva-se, a partir da imprensa, alguns excertos dessa mensagem: “Na minha vida, nunca tive planos, ambições ou objectivos, apenas me deixei levar e viver o presente. Desde que entrei no mundo do desporto, posso dizer que algumas coisas amadureceram em mim, como o sonho de fazer parte de uma equipa francesa. Hoje posso dizer com muito orgulho que o consegui alcançar. Consegui encontrar o meu caminho e dar sentido ao que faço todos os dias: querer ser uma referência para as pessoas com deficiência”.
"A partir de agora, espera-me outra batalha, que aguardava com impaciência. Aqui estou eu, pronto mais uma vez para enfrentar, ultrapassar e seguir em frente sem ter em conta o que os outros possam dizer ou pensar de mim; agora, tenho uma segunda batalha para travar com a comunidade LGBTQIA+ e espero dar força e coragem aos desportistas de alta competição que ainda não se atrevem a viver às claras e a desfrutar livremente da liberdade que é nossa por direito. A deficiência não é algo que deva ser escondido e o mesmo se aplica à orientação sexual. Crianças e adultos continuam a suicidar-se e a ser mortos. Não se esqueça de que as pessoas à sua volta também podem ser afectadas um dia".
5. Aceitar esta mensagem e efectivá-la, é sinal positivo de afirmação da dignidade da pessoa humana. De qualquer pessoa humana.